Em entrevista ao g1 nesta terça-feira (19), a mãe de Ana Clara, Ana Cláudia Ferreira dos Santos, que mora no Ceará, cobra esclarecimentos sobre a morte da filha. O caso foi arquivado por falta de provas.
"O que eu mais desejo no mundo é que este caso seja resolvido, mas só Deus, porque moro muito longe e não tenho como levar esse caso para frente. As pessoas que estavam me ajudando nisso ficaram com medo do que aconteceu e por faltava de prova o caso foi arquivado", disse Ana Cláudia.
Há quatro processos criminais contra o policial, um deles ativo:
- Um inquérito policial que apurava possível prática de homicídio foi arquivado a pedido do Ministério Público por não ter havido indícios suficientes de autoria e materialidade.
- Um inquérito de violência doméstica pela suposta prática do crime de ameaça foi extinto após o réu ter se retratado e a vítima ter optado pelo não prosseguimento do processo.
- Um processo que apurava a prática do delito de ameaça foi arquivado após ter sido declarada extinta a punibilidade em razão da prescrição do suposto delito.
- Está em curso processo pela suposta prática do crime de estelionato, em tramitação na 3ª Vara Criminal de Mossoró, envolvendo uso de cheques de terceiros.
Conforme a mãe da universitária, Ana Clara estava morando em Mossoró, onde cursava enfermagem na Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). Foi na mesma cidade que a jovem conheceu Khlisto, que a convidou para uma festa em uma cidade vizinha no dia 17 de novembro de 2019.
"Ele convidou ela para ir a um aniversário da família dele em Apodi. Em seguida ela começou a passar mal e veio ao meu conhecimento que ela tinha tido um infarto. Até então eu não sabia desse relacionamento deles e quando eu soube da notícia eu fui para Mossoró. Já lá, aproximadamente umas 23 horas, a gente ainda tava tentando falar com ele sem um pingo de sucesso", disse a mãe de Ana Clara.
Segundo Cláudio, quando finalmente se encontrou com Khlisto ele estava com cheiro de bebida alcoólica e passou a falar mal de Ana Clara.
"Quando ele chegou ele tava com um cheiro forte de álcool e falou para mim que tinha feito tudo para salvar a vida dela. Em seguida ele começou a falar mal da minha filha, os termos que ele usou tipo: 'ela bebia, mas não de virar as pernas', daí eu perguntei várias vezes de quem ele tava falando, porque essa pessoa na qual ele falava não era a minha filha, ele estava descrevendo uma pessoa totalmente diferente dela, e aí ele me falou que tinha tentado socorrer a minha filha, que tinha feito tudo", relembrou Cláudia.
A mãe da jovem foi ao hotel onde a filha estava hospedada com Khlisto em busca de saber o que tinha acontecido e soube por uma testemunha que Ana Clara começou a passar mal após tomar uma água dada a ela pelo policial.
"A pessoa falou que ouviu gritos e no meio deles ela [Ana Clara] perguntava porque não podia dar água pra filha dele [Khlisto]. Depois disso, ela começou a passar mal, o moço disse que ela tinha vomitado todo o banheiro. Aí ele pegou os filhos dele e pediu para irmã que estava no quarto ao lado para voltar para Mossoró", falou Cláudia.
Ainda de acordo com a mãe da vítima, outra testemunha que também estava no hotel relatou a ela que uma ambulância do Samu foi acionada, mas quando os socorristas chegaram ao local Khlisto teria tentado impedir o socorro de Ana Clara, alegando que era médico e iria fazer os primeiros socorros.
"Ele fez o translado de Apodi pra Mossoró sem a minha autorização, fez tudo como se fosse da família, foi na delegacia deu depoimento dele e depois deu depoimento informando o lugar errado de onde tudo ocorreu", falou Cláudia.
Causa da morte
Até então a causa da morte de Ana Clara ainda não tinha sido esclarecida e só cerca de um mês após o falecimento da universitária a família recebeu o laudo que constava a causa da morte por overdose por cocaína por solução não injetável, segundo a mãe da universitária.
A suspeita da família de Ana Clara é que a droga tenha sido colocada na água que a universitária consumiu.
"Uma hora ele se virou pra minha outra filha que estava lá e disse 'não se surpreenda com o laudo que está para sair'. Minha filha era super estudiosa, não gostava de festas, não gostava de lugar agitado, nem de bebidas alcoólicas, ela gostava de livros e de estar com a sua família. Então me surpreendeu bastante e até hoje eu sofro com esse laudo", lamentou a mãe da universitária.
Khlisto responde judicialmente por violência doméstica na comarca de Fortaleza, em 2020, por suspeita de agredir uma mulher na cidade de Mossoró e por estelionato no mesmo Estado, cometido em 2009.
Prisão
Khlisto foi preso na noite do último sábado (16), após ser flagrado se passando por médico no Hospital Municipal de Paraipaba. O policial usava o registro no Conselho Regional de Medicina (CRM) de um médico do Rio Grande do Norte, que soube do uso indevido do seu documento e fez a denúncia que levou a prisão.
No domingo (17) ele foi solto em uma audiência de custódia. Na decisão, a juíza de plantão suspendeu os efeitos da prisão em flagrante e concedeu a liberdade provisória do PM, com dispensa do pagamento de fiança.
Na ocasião, juíza decidiu ainda que Khlisto deverá cumprir as seguintes condições, sob pena de revogação do benefício:
- comparecimento trimestral ao Juízo competente para informar e justificar atividades;
- comparecimento ao Juízo competente em todos os atos do processo ou sempre que for chamado, ou em caso de impossibilidade, a justificação prévia da ausência;
- obrigação de comunicar ao Juízo competente, previamente, as alterações de endereço.
- Após a repercusão do caso, a Prefeitura de Itapajé informou que o policial foi enviado como substituto de plantonistas fixos do Hospital e Maternidade João Ferreira Gomes em três ocasiões na atual gestão. Em um dos atendimentos o agente receitou morfina para uma paciente.
Ainda de acordo com a prefeitura, os prontuários dos pacientes atendidos pelo suposto médico serão revisados.
"Todas as fichas de pacientes atendidos pelo suposto médico serão revisadas e as medidas legais serão aplicadas, tanto para o suposto médico quanto para a empresa responsável por este, que não tem ligação com os serviços prestado a Prefeitura de Paraipaba. A prefeitura está tomando as medidas cabíveis para que ocorra punição e ressarcimento financeiro", disse a prefeitura de Itapajé.
O Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Norte (CREMERN), órgão em que o médico que teve o CRM copiado é inscrito, repudiou a atuação do falso médico e destacou a importância de formalizar denúncias contra a prática do charlatanismo.
" Qualquer profissional ou cidadão, que souber de algum ato como esse poderá encaminhar a denúncia diretamente ao Ministério Público (MP) ou à Polícia. No caso em questão, como não se trata de um profissional médico devidamente inscrito, não será passível abertura de sindicância", disse o órgão.
Já a Polícia Militar informou que Khlisto está afastado das atividades na corporação por meio de licença para tratamento de saúde. "Atualmente, encontra-se na situação de agregado por, há mais de um ano, estar nessa condição. A PMCE está produzindo relatório para abertura de procedimento disciplinar junto à Controladoria Geral de Disciplina (CGD)", complementou a instituição.
G1 CE