O fóssil é datado do período Cretáceo, vivendo há cerca de 110 e 115 milhões de anos. O Ubirajara jubatus se tornou o dinossauro mais antigo da Bacia do Araripe, considerada um “ancestral” das aves. O holótipo — peça única que serviu de base para a descrição da espécie — está no Museu Estadual de História Natural de Karlsruhe, na Alemanha.
Conforme publicado pelo jornal alemão Badische Neueste Nachrichten, a ministra da Ciência alemã, Theresia Bauer, propôs a devolução do material por reconhecer que o fóssil chegou à Alemanha por meios pouco claros.
"Temos uma postura clara que se expressa em ações consistentes: se houver objetos em nossas coleções de museus que foram adquiridos sob condições legal ou eticamente inaceitáveis, uma devolução será considerada. O Ubirajara deve, portanto, voltar para o Brasil devido à sua grande importância e às questionáveis ??circunstâncias de sua aquisição", pontuou Bauer.
Inicialmente, o fóssil deve ser levado ao Museu Nacional, no Rio de Janeiro, mas Allysson Pinheiro informou que a instituição cearense vai dialogar com as autoridades fluminenses, para que a peça seja encaminhada ao Museu de Paleontologia Plácido Cidade Nuvens.
A instituição caririense, inclusive, já demonstrava grande expectativa que o governo alemão tomasse decisão favorável ao processo de devolução, mesmo antes da reunião desta terça.
“Essa peça virou uma bandeira. Ficou um caso muito explícito onde os pesquisadores, na própria descrição da espécie, citam a forma como foi adquirido o material e, claramente, não foi em conformidade com as nossas legislações”, explicou o diretor do museu.
“A peça é superinteressante; é um dinossauro que tem características que levam a transição para as aves, estruturas que não se conheciam ainda em dinossauros, mas o que chamou a atenção foi o fato chato na descrição que, inclusive, motivou a retirada, a despublicação do artigo científico — algo muito sério e raríssimo”, complementou Allysson.
“A expectativa é muito alta porque isso é uma vitória coletiva muito grande; um sinal que as coisas estão melhorando, estão mudando nas relações entre os países e uma ‘boa ciência’, vamos dizer assim. E isso só aconteceu por conta de uma mobilização da sociedade brasileira e da comunidade científica como um todo”, declarou Allysson, que é professor da Universidade Regional do Cariri (Urca).
Retirada ilegal
A ida do material para a Alemanha é questionada há anos pela comunidade científica brasileira, que aponta para uma possível exportação ilegal de peças coletadas no Brasil. Em dezembro de 2020, o Ministério Público Federal (MPF) instaurou um procedimento para investigar a saída do fóssil.
“Esse infelizmente não é o único caso, não é só com a Alemanha. A gente está tentando entrar em contato com várias instituições, solicitando espontaneamente, gentilmente, e explicando o porquê isso é importante”, declarou o diretor do museu no Cariri.
Anteriormente, o museu onde o fóssil se encontra se recusou a devolver a peça, mas o diretor da instituição cearense avaliou de maneira promissora o diálogo com o país europeu, informando ainda que há uma expectativa que outras peças retornem ao Brasil até o fim do ano.
“Essa conversa com os museus alemães iniciou há algum tempo, tem sido uma conversa frutífera. A nossa expectativa é que outros fósseis possam retornar da Alemanha para o Brasil”, destacou Allysson, que é doutor Ecologia e Recursos Naturais..
O pesquisador reforça a importância do material fossilífero ser repatriado não apenas para o Ceará, mas para o Museu de Paleontologia Plácido Cidade Nuvens, em Santana do Cariri, localizado na região da Bacia do Araripe, de onde eles foram retirados.
“A Bacia do Araripe está no top 5 do mundo de depósitos fossilíferos do cretáceo. Os fósseis daqui são celebrados mundialmente. Por isso, inclusive, que a gente tem tanto problema com tráfico e comercialização”, explicou Allysson.
“O fóssil aqui, para além do Araripe, está no DNA do povo do Cariri; é parte cultural, está nos poemas, nos artesanatos, nas comidas, nas manifestações culturais da região. Passa até nas manifestações do Padre Cícero, que disse que esse sertão já foi mar. É um simbolismo que não tem em nenhum outro lugar do mundo”, complementou o diretor.
G1 CE