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Conheça o cardeal brasileiro que quase virou Papa em conclave que elegeu João Paulo II

Sua trajetória foi marcada pela luta por direitos humanos e um sequestro dramático em presídio cearense

Thiago Rodrigues
Por: Thiago Rodrigues Fonte: GCMais
09/05/2025 às 01h01 Atualizada em 09/05/2025 às 01h22
Conheça o cardeal brasileiro que quase virou Papa em conclave que elegeu João Paulo II
Foto: Reprodução

Quase cinco décadas atrás, um brasileiro esteve a um passo de se tornar Papa. Durante o conclave de outubro de 1978, o cardeal Dom Aloísio Lorscheider, então arcebispo de Fortaleza, teria sido o primeiro a alcançar a maioria dos votos para assumir o comando da Igreja Católica. No entanto, por problemas cardíacos, recusou o posto — uma decisão que, segundo relatos recentes do teólogo Frei Betto, abriu caminho para a eleição do polonês Karol Wojtyla, o João Paulo II.

A revelação foi feita em artigo publicado por Frei Betto em abril deste ano, relembrando os bastidores do histórico conclave, que ocorreu após a morte repentina de João Paulo I, com apenas 33 dias de papado. Dom Aloísio Lorscheider, que tinha oito pontes de safena, teria temido que sua saúde não suportasse o cargo, forçando a Igreja a enfrentar mais um conclave em curto prazo.

O que poderia ter sido um dos maiores marcos da Igreja na América Latina virou um episódio pouco conhecido fora dos círculos eclesiásticos — e, curiosamente, até retratado na ficção, no filme O Poderoso Chefão: Parte 3, onde seu nome é mencionado como um dos votados no conclave encenado.

Uma vida dedicada à fé e à justiça

Nascido em 1924, na cidade de Estrela (RS), Leo Arlindo Lorscheider, neto de imigrantes alemães, adotou o nome religioso de Frei Aloísio em 1944. Foi ordenado sacerdote aos 23 anos, ainda sob o papado de Pio XII, e passou por diversas funções na Igreja até se tornar bispo de Santo Ângelo (RS) e, posteriormente, arcebispo de Fortaleza, nomeado em 1973 por Paulo VI.

Ao longo de sua trajetória, defendeu causas sociais, como a distribuição de renda, o direito à terra, a redemocratização do país e o fim das torturas durante a ditadura militar. Também foi presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e atuou em instituições internacionais, como a Cáritas e o Conselho Pontifício “Cor Unum”. No Ceará, seu legado é lembrado pela criação de 11 novas paróquias e pelo compromisso com os mais pobres. Foi um dos religiosos mais engajados na luta por justiça social, o que lhe rendeu prestígio — e também perigos.

O sequestro que parou o Ceará

Em 1994, o cardeal protagonizou um dos episódios mais dramáticos da história recente do Ceará. Durante uma visita ao Instituto Penal Paulo Sarasate, em Aquiraz, para apurar denúncias de maus-tratos, foi feito refém por detentos armados com facas, junto com outras 11 pessoas, incluindo padres, um vereador e um deputado.

Sob forte calor, todos foram levados em um carro-forte até Quixadá, a 150 km de distância. A ação terminou sem feridos entre os reféns, mas dois sequestradores morreram em confronto com a polícia. O líder da rebelião, conhecido como “Carioca”, foi preso novamente em 2017.

Últimos anos e legado

Dom Aloísio deixou a Arquidiocese de Fortaleza em 1995 e assumiu o cargo de arcebispo de Aparecida, onde ficou até sua renúncia em 2000. Morreu em dezembro de 2007, aos 83 anos, poucos meses antes de completar 60 anos de sacerdócio. Lorscheider viveu durante sete pontificados, participou de dois conclaves e deixou um exemplo de liderança espiritual comprometida com a justiça, a paz e os mais vulneráveis.