Com a expansão de vagas de Medicina nos últimos anos, graduações para formar novos médicos viraram a “galinha dos ovos de ouro” das faculdades e causam racha no setor. Diante de centenas de pedidos de abertura de cursos por liminar, associações do ensino superior privado protagonizam briga no Judiciário por defenderem critérios distintos para liberar mais escolas médicas.
Paralelamente, grandes e pequenos grupos empresariais investem cada vez mais na educação médica de olho no mercado bilionário e que se destaca pelo elevado retorno e baixa evasão. Já especialistas e entidades médicas veem risco de a rapidez na criação de novos cursos resultar na formação precária, com oferta de vagas em locais sem estrutura mínima ou avaliação correta das condições de ensino.
O estudo Demografia Médica, conduzido pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e Associação Médica Brasileira (AMB), estima que uma única vaga em Medicina represente ativo de R$ 2 milhões para a instituição.
E a receita potencial das graduações privadas no País é de R$ 20,9 bilhões em 2022, considerando a ocupação de todas as vagas ao longo dos seis anos do curso. Isso representa incremento de quatro vezes na cifra de 20 anos atrás (R$ 5 bilhões), em valores atualizados.
As vagas dobraram em dez anos: de 20.570 em 2013 para 41.805 no ano passado, segundo o estudo da USP feito com base em dados do Ministério da Educação (MEC). Aproximadamente 90% das vagas da última década foram abertas no setor privado, com incentivo primeiro da Lei do Mais Médicos, de 2013, e depois por uma chuva de liminares, que permitiu abrir escolas mesmo durante a moratória do governo federal que proibiu novos cursos por cinco anos - e que terminou no último dia 5 de abril.
As instituições autoras dos pedidos judiciais alegam que tanto a lei do Mais Médicos, ao condicionar a abertura de cursos a critérios e localidades definidos pelo MEC, quanto a moratória ferem o princípio da liberdade econômica. Graças às ações judiciais, 6 mil vagas foram abertas nos cinco anos de veto e, segundo o MEC, há pelo menos 225 pedidos tramitando na Justiça para abrir cursos, o que representaria mais 20 mil vagas.
“O fato de Medicina ter a mensalidade mais cara entre as graduações e de ser um dos cursos com menor evasão a transformou na galinha dos ovos de ouro das instituições de ensino. Há intenso movimento de aquisições de faculdades pequenas por grandes grupos educacionais”, diz Mario Scheffer, professor da USP e coordenador do estudo Demografia Médica.
O valor médio da mensalidade em Medicina é de R$ 9 mil, segundo levantamento feito pelos pesquisadores. Já a evasão é menor que 7%, enquanto chega a 30% nas demais graduações, segundo dados do Semesp, entidade que representa instituições particulares.
Líder em número de cursos de Medicina no Brasil, a Afya administra 3.163 vagas, em 30 escolas, distribuídas em 14 Estados. Fundada no Tocantins no fim da década de 1990, com o nome NRE, a empresa cresceu principalmente por meio de aquisições de faculdades menores, sobretudo no interior.
Estadão Conteúdo